quarta-feira, 1 de junho de 2011

Entrevista com professor de português sobre a sua pesquisa com redações escolares

Entrevista realizada por: Cristhiane Falchetti
Entrevistado: Rafael Henrique Palomino (mestrando da UNESP/Araraquara e
professor de português no ensino fundamental e médio)


 
1- Em que consiste sua pesquisa?

Pesquisei em um corpus de redações de vestibulandos uma série de características recorrentes em seus textos, a maior parte pertinente à constituição dos alunos como sujeitos de sua expressão. Para isso, foi importante considerar a recorrência de expressões e pontos de vista em um corpus de redações que tinham a tarefa de argumentar e se posicionar criticamente a respeito de temas polêmicos. Supõe-se que em um corpus com essas características, as opiniões, argumentos, modos de se posicionar ante o leitor, etc., iriam variar.

2- Você tratou de representações sociais em sua pesquisa. Isso incluía a representação social que os alunos fazem dos professores? De que modo?

Era analisado o modo de o aluno lidar com seu enunciatário. Toda escolha linguística é feita com o interlocutor como referência. Se eu o considero, por exemplo, especialista no tema de que trato, dialogo com ele de um modo (ou seja, faço certas escolhas linguísticas), se o considero um completo leigo, dialogo de outro, etc. A maneira como os alunos se posicionam ante seu interlocutor, em suas redações, informava como esse enunciatário era concebido por eles. Pela análise de suas escolhas linguísticas, temos pistas de como o enunciatário é concebido pelo aluno.

3- Quais foram suas conclusões a respeito, especificamente, da representação social que os alunos fazem dos professores?

Em minha pesquisa, constatei que os alunos tratavam seu leitor como um enunciatário com o qual não é possível polemizar. Concluí isso porque eles não tentavam conduzir o enunciatário (o professor) a conclusões, não argumentavam logicamente. Apenas repetiam o senso comum, pressupondo a adesão do leitor. Ou seja, afirmavam ao leitor aquilo que supunham que o leitor já cria. É importante lembrar que o professor é o agente legitimado por uma instituição social (a escola) para defender os valores estabelecidos pelo grupo social a que pertence. Esse tipo de ação lingüística realizada pelo professor todo dia na sala de aula, chamado na retórica clássica de discurso epidíctico, é autojustificado, exime o professor de argumentar, como se sua palavra já fosse valiosa apenas por ser sua, não precisando de argumentação que a sustente. Como polemizar com um enunciatário desses? Ainda mais quando ele pode diminuir sua nota se não gostar do que você fala? Não há como fazer isso. O aluno apenas presume o que o professor gostaria de ouvir e o repete para ele. Como o professor é o defensor dos valores estabelecidos, o agente legitimado de uma instituição guardiã desses valores, os alunos vão repetir esses valores para o professor, da forma como os apreendem. Os valores consensuais de um grupo social podem ser bastante próximos – ou, no mínimo, facilmente confundidos – com o senso comum, que é uma espécie de sabedoria legitimada pela sociedade e que parece fora de questão. Daí o recurso exagerado ao consenso nas redações. Isso aponta uma imagem de enunciatário autoritário, conservador, afeito a valores consensuais do grupo e intolerante com posições contrárias, que não está disposto a verdadeiramente debater temas com o aluno, mas sim a verificar a correção do aluno quando de sua participação em um debate sobre um tema.

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